A Lição da Água

O rio Tapajós corria, calmo e suave. Em seu leito, três existências se cruzavam em um delicado e perigoso equilíbrio.
O piau, era conhecido por sua curiosidade insaciável. Ele não era o maior, mas certamente era o mais aventureiro. Sua vida era uma dança entre o concreto do Hidroviário e as sobras do velho trapiche de madeira, um festival de sabores, banana e massa de pão.
Perto do fundo, jazia a Isca, um pequeno e delicioso pedaço de banana, doce e brilhante, que tentava parecer o petisco mais suculento do universo. Ele estava preso a um destino que não havia escolhido. “É sempre assim”, ele suspirava em seu silêncio de medo e pena. “Eu sou a tentação, a promessa… e a desgraça.”
Pairando acima de tudo, o Anzol era o silêncio de prata. Ele não tinha emoção, apenas função: prender. Era a ponta afiada e fria de uma intenção maior. Ele via o mundo de cima, um observador estoico esperando o movimento. “O destino não é feito de escolhas, mas de ação e reação,” pensava ele, imóvel.
O Encontro no Limite
Um dia, a Isca balançou na correnteza com um movimento especialmente sedutor. O Piau faminto, vindo de uma longa e tediosa manhã, viu o brilho.
“Olhe só,” ele pensou, “um lanche fácil, flutuando sem esforço. Que sorte a minha!”
Ele nadou para mais perto, e a Isca sentiu o movimento na água. “Lá vem ele,” pensou a Isca, “o curioso, o faminto. Se ele soubesse o preço desse ‘lanche’…”
O Anzol, sentindo a vibração, estava pronto.
“Ei, bananinha!” chamou o Piau. “Você parece muito… disponível.”
A Isca, que não podia falar, tentou transmitir um aviso através de seu balançar, um pequeno e desesperado movimento de negação.
O Anzol, vendo a hesitação, intensificou o brilho. O Piau interpretou isso como uma “chamada” para a refeição.
A Nova Perspectiva
Por um instante crucial, o Piau parou, a poucos centímetros da Isca.
“Por que você não está fugindo?”, perguntou ele, percebendo algo estranho. “Toda isca tenta se esconder de mim.”
A Isca tremeu, e o Piau, que tinha um senso de observação apurado, notou o minúsculo ponto de metal prateado que se escondia sob o corpo da Isca: o Anzol.
Naquele momento, o Piau entendeu. Ele não estava vendo um almoço, mas uma armadilha.
Ele olhou para a Isca e viu não a comida, mas o peão. Ele olhou para o Anzol e viu não uma pedra no fundo, mas o perigo.
“Você é a tentação que esconde a dor,” disse o Piau, afastando-se lentamente.
A Isca, com seu corpo inerte, sentiu uma estranha leveza. Ela havia falhado em sua função de chamar, mas tinha conseguido enviar um aviso.
O Anzol, imóvel, sentiu o vazio da oportunidade perdida. Sua única reação foi aguardar novamente, sabendo que, mais cedo ou mais tarde, a curiosidade ou a fome de outro Peixe seria maior que o instinto de cautela.
E o Piau? Ele continuou seu caminho, mais sábio. Ele entendeu que, às vezes, a coisa mais brilhante e fácil de se alcançar é a que tem o preço mais alto.
A Moral da História
O Peixe aprendeu sobre a cautela e a perspectiva; a Isca descobriu o poder de um aviso silencioso; e o Anzol permaneceu, um lembrete frio e eterno de que o perigo está sempre à espreita.

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